Estudando a Lei do Ato Médico

Enmanuely Soares
Médico em atendimento

A Lei nº 12.842/2013, conhecida como Lei do Ato Médico, é uma das legislações mais importantes para a regulamentação da prática médica no Brasil. Sancionada em 2013, essa lei define as atividades exclusivas dos médicos, como a formulação de diagnósticos, a prescrição de tratamentos e a realização de procedimentos cirúrgicos, entre outras. Contudo, essa legislação, que busca garantir a segurança dos pacientes e a qualidade no atendimento, também gerou debates e controvérsias, especialmente no que diz respeito à autonomia de outras categorias da saúde.

A origem da Lei do Ato Médico

A Lei do Ato Médico originou-se do Projeto de Lei nº 7703/2006, apresentado pelo Senador Benício Sampaio, com o objetivo de delimitar com clareza quais atividades seriam exclusivas dos médicos. O projeto foi impulsionado pela crescente preocupação com a segurança no atendimento à saúde e a necessidade de garantir que procedimentos complexos fossem realizados por profissionais altamente qualificados. O longo processo legislativo envolveu intensos debates entre políticos, entidades médicas e representantes de outras profissões da saúde, culminando em uma lei que, até hoje, é objeto de discussões e desafios jurídicos.

Principais disposições da Lei

A Lei nº 12.842/2013 estabelece um conjunto de diretrizes que delimitam as atividades privativas dos médicos, entre elas:

– Diagnóstico Nosológico: Somente médicos podem formular o diagnóstico nosológico, que envolve a análise detalhada de sintomas e a determinação da patologia que acomete o paciente.

– Prescrição de Tratamentos e Medicamentos: Apenas médicos estão autorizados a prescrever tratamentos e medicamentos para seus pacientes, uma atribuição que exige profundo conhecimento técnico e científico.

– Procedimentos Invasivos e Cirúrgicos: A realização de cirurgias e outros procedimentos invasivos também é exclusiva dos médicos, reforçando a necessidade de qualificação específica para garantir a segurança do paciente.

– Coordenação de Equipes Médicas: Em procedimentos complexos, a coordenação de equipes médicas é atribuída ao médico, que lidera e supervisiona as ações de outros profissionais envolvidos no atendimento.

É importante ressaltar que, embora a lei estabeleça atividades exclusivas dos médicos, ela também respeita a autonomia de outras profissões da saúde, como enfermagem, fisioterapia e psicologia, que desempenham papéis essenciais e complementares na assistência aos pacientes.

Controvérsias e debates jurídicos

Desde sua promulgação, a Lei do Ato Médico tem sido alvo de controvérsias, principalmente envolvendo a delimitação das atividades exclusivas dos médicos e a preservação da autonomia de outras profissões da saúde. Vários debates jurídicos emergiram, destacando a tensão entre a regulamentação da prática médica e o papel de outras categorias de saúde.

Em 2014, por exemplo, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) moveu uma ação questionando a exclusividade dos médicos na realização de diagnósticos nosológicos, argumentando que essa restrição prejudicava a atuação dos enfermeiros em situações de emergência. O judiciário, no entanto, manteve a exclusividade do diagnóstico nosológico para os médicos, reconhecendo a necessidade de preservar a segurança dos pacientes. Contudo, foi reafirmado o papel crucial dos enfermeiros em emergências, desde que suas ações respeitassem os limites estabelecidos pela lei.

Outro exemplo de debate jurídico ocorreu em 2015, quando o Conselho Federal de Psicologia (CFP) ajuizou uma ação civil pública contra a Lei do Ato Médico, alegando que ela impedia os psicólogos de diagnosticar e tratar transtornos mentais. A decisão judicial foi clara ao afirmar que o diagnóstico nosológico é uma atribuição exclusiva dos médicos, mas que os psicólogos mantêm a competência para diagnosticar e tratar transtornos mentais, desde que não envolvam diagnóstico nosológico formal.

Esses casos exemplificam a complexidade das interações entre as diversas profissões da saúde e a medicina, especialmente em um contexto onde a definição clara das competências de cada profissão é fundamental para assegurar a qualidade e a segurança do atendimento.

Repercussões e ações judiciais

As repercussões da Lei do Ato Médico vão além dos debates jurídicos. Sua implementação teve um impacto profundo nas relações entre médicos e outros profissionais de saúde, gerando uma série de ações judiciais que contestam a interpretação da lei. Embora a legislação tenha sido criada com o intuito de proteger os pacientes e garantir a qualidade do atendimento médico, é inegável que ela também trouxe à tona tensões sobre a autonomia das outras profissões da saúde.

No entanto, é importante reconhecer que o judiciário tem mantido o equilíbrio ao julgar esses casos, reafirmando a importância da legislação na proteção da integridade do ato médico, mas também assegurando que outras profissões da saúde continuem a desempenhar suas funções de forma autônoma, dentro de suas respectivas áreas de competência.

A Lei do Ato Médico é um marco na regulamentação da prática médica no Brasil, mas também levanta questões importantes sobre a interação entre as diversas profissões da saúde. A definição clara das atividades exclusivas dos médicos é fundamental para garantir a segurança dos pacientes, mas é igualmente crucial que a autonomia das outras profissões seja respeitada.

Resoluções do CFM: Reforçando a proteção do Ato Médico e a responsabilidade técnica

Após a aprovação da Lei do Ato Médico em 2013, o CFM emitiu novas resoluções que reforçam os princípios da legislação. Como exemplo podemos citar a Resolução CFM nº 2.321/2022 que assegura que eventos médico-científicos sejam coordenados tecnicamente por médicos, prevenindo a disseminação inadequada de conhecimentos. Já a Resolução CFM nº 2.379/2024 na qual define e disciplina a medicina do sono como ato médico exclusivo.


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